Nasceu pobre, começou a trabalhar ainda criança. Filho de
operário, operário é. Aos 15, já dava expediente em uma fábrica de tecidos, supervisionando
adultos. Aos 20 e poucos já era casado. Mudou de Estado por causa do trabalho,
teve 7 filhos. A vida dura talvez tenha deixado aquele homem com poucas
palavras e poucos sorrisos. Sustentar a mulher e as crianças não era fácil, mas
o narigão e o bigode apontavam a direção: sempre em frente. Os filhos
cresceram, chegaram 19 netos. Até que, num mesmo ano, perdeu a esposa e uma
filha. As palavras e os sorrisos, que já eram poucos, poderiam ter sumido de
vez. Mas algo aconteceu. Em vez disso, ele desabrochou. O rosto se abria cada
vez mais, o olhar e a vontade de viver eram nítidos para familiares e
estranhos. Puxava papo e cativava desconhecidos na rua. Criou bordões, sabia de
cor o aniversário de todos os filhos, netos, 14 bisnetos e até a tataraneta –
andava com sua foto na carteira, para mostrar a todos. Tomava cerveja, vinho,
cachaça, pescava, viajava o Brasil e o mundo, adorava festa e gente. Contava
histórias, antigas e recentes. Ria-se. “É esse o meu pai?”, se perguntavam os
filhos. “É esse o meu avô?”, se espantavam os netos. Era. Fez 80, 85, 90, 94
anos com muitas palavras e muitos sorrisos. “Nossa, mas ele tem isso tudo?”,
perguntava quem o via pela primeira vez. Sim, ele tinha isso tudo: energia,
amor, bom humor, idade. Mas o mundo não é o estranho caso de Benjamin Button. O
tempo cobrou seus juros e ele foi embora encontrar a mulher, a filha e os
irmãos que já tinham ido. Deixou um legado imaterial, difícil de explicar, mas
fácil de sentir pra qualquer um que tenha convivido com ele. Família e amigos se
despediram em uma tarde quente, de sol forte. E eis que na hora do adeus, inexplicável,
surge um arco íris no céu. Um sinal lá do alto. Ou nossas lágrimas evaporando.
Obrigado, Seu Nilson. Deus te abençoe 10 vezes.